Vitrines estrangeiras
Produtos comprados em sites estrangeiros podem até ser atraentes, mas nem sempre vale a pena arriscar. Veja as principais dicas para não passar apuros
"Antes mundo era pequeno porque Terra era grande. Hoje mundo é muito grande, porque Terra é pequena." Esse trecho da canção 'Parabolicamará', de Gilberto Gil, bem que pode ser usado para entendermos o que é o comércio via internet. Afinal, a rede mundial faz com que a Terra se torne minúscula: o brasileiro, sem sair de casa, pode comprar os mais variados produtos diretamente da China, dos EUA, da Europa... E assim suas possibilidades de consumo tornam-se imensas. Mas, será que esse tipo de comércio é essa maravilha toda? A resposta é não — a não ser que o consumidor tome alguns cuidados e saiba quais riscos está correndo.
A principal dúvida referente a compras realizadas em sites estrangeiros é: o Código de Defesa do Consumidor (CDC) — lei brasileira, portanto — pode ser aplicado nesse tipo de transação? Segundo Christian Printes, advogado do Idec, o CDC pode amparar o consumidor brasileiro, mas apenas em alguns casos: se o site tiver representante oficial no Brasil; ou quando os produtos forem importados por uma empresa estabelecida em solo nacional.
"O consumidor pode checar isso nos termos e condições gerais do próprio site", afirma Printes. Outra possibilidade para aplicação do CDC é quando o site se dirige explicitamente ao consumidor brasileiro, mesmo não tendo vínculos formais com o Brasil. "Por exemplo, se o site estiver em português, aceitar cartão de crédito daqui ou oferecer preços já em reais", acrescenta Printes.
Portanto, a primeira orientação é checar se o site se enquadra em um dos casos descritos anteriormente. Já é um bom começo, mesmo que isso não seja garantia absoluta de que eventuais problemas serão resolvidos com facilidade. Verifique também quais são as formas de contato com a empresa: além de e-mail, é importante ter um endereço e um número de telefone. Se for um número brasileiro, melhor ainda. E, claro, buscar referências e opinião de outros consumidores.
No entanto, independentemente da possibilidade de o consumidor poder ou não se amparar no CDC, é sempre bom ponderar: se acontecer algum problema com a compra realizada em site estrangeiro, provavelmente a solução não será tão simples. As queixas mais frequentes são envio de mercadoria diferente da encomendada, produto com defeito, atraso na entrega e até jamais receber o produto.
O fotógrafo Jairo Lopes Júnior, de Mesquita (RJ), está até hoje esperando o envio de uma mercadoria comprada em site chinês, em outubro de 2012. "Como sou fotógrafo, precisava de um flash. Entrei no site em questão, vi que o preço estava bom e comprei o produto. Inclusive alguns amigos, que já compraram nesse site, me disseram que suas encomendas haviam chegado", conta ele.
Sem sua ferramenta de trabalho, Lopes fez uma nova compra. Desta vez, preferiu um site brasileiro. "Paguei o dobro do preço, mas valeu a pena, pois o produto chegou em menos de uma semana." O fotógrafo tentou entrar em contato com o site várias vezes, por meio de chat de atendimento ao cliente. Mas nem sempre conseguia. E, quando era atendido, a comunicação era truncada, pois ele não domina o idioma inglês. "O atendente disse que o problema seria resolvido. Mas, quando faço o login no site, minha compra aparece como finalizada. Já perdi as esperanças. O prejuízo foi de cerca de R$ 300."
A eficiência da comunicação com o serviço de atendimento ao cliente, aliás, é um fator a ser considerado, pois raramente as conversas serão em português. E, mesmo que sejam, não se pode esperar um português perfeito. Outro grande site chinês costuma dar uma resposta padrão aos consumidores brasileiros que enfrentam algum problema na transação: "Desculpe a responder às suas informações agora, para trazê-lo incomodado. Muito desculpe! Vamos verificar o seu pedido novamente e está resolver o problema logo que possível. No caso que temos os resultados, imediatamente lhe enviaremos as informações para Vc". Diante de afirmações desse tipo, provavelmente elaboradas com o auxílio de um site de tradução, é provável que a confiança do consumidor fique ainda menor...
- Antes de comprar, obtenha referências do site; pesquise na internet a opinião de outros consumidores;
- Tenha certeza de que o site tem protocolo de segurança (aquele pequeno ícone em forma de cadeado);
- Certifique-se de que o site tem um canal de atendimento ao consumidor (e-mail, telefone, endereço);
- Se o site tiver um representante no Brasil, melhor;
- Comprar produtos de marcas que têm assistência técnica no Brasil é menos arriscado;
- Confira se as especificações técnicas do produto são iguais às brasileiras;
- Leia atentamente as condições de venda;
- Avalie se, após a incidência de todos os impostos, além dos custos com transporte e frete, vale mesmo a pena comprar em um site estrangeiro;
- Livros são isentos de Imposto de Importação;
- Se você precisar do produto com urgência, talvez não valha a pena comprar em um site de outro país, pois as entregas costumam demorar;
- Não deixe de imprimir ou arquivar todos os documentos referentes à compra (como número do pedido, preço final, condições de venda, prazo de entrega etc.).
NEM SEMPRE É TÃO BARATO
Outra ponderação importante se refere aos impostos que incidem sobre a mercadoria. A chamada "tributação simplificada" é aplicável à importação de bens via Correios, companhias aéreas e empresas de entrega internacional. A taxa de importação é de 60% sobre o valor do produto, mas o preço máximo dos bens não pode ultrapassar US$ 3 mil. Além desse imposto, há incidência de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, que varia de acordo com o Estado) e, caso a transação seja via cartão de crédito, de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras). Há ainda custos com o transporte e seguro. Resultado: o preço final da mercadoria pode ser até maior que o dobro do valor inicial anunciado. É importante considerar esse custo total para avaliar se de fato a compra vale a pena.
No entanto, há alguns produtos que são isentos de Imposto de Importação: livros, jornais e periódicos impressos. Medicamentos também são isentos, mas a droga precisa ter sido homologada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e, no momento da retirada, deve-se apresentar a receita médica. Remessas até US$ 50 estão isentas, desde que o remetente e o destinatário sejam pessoas físicas.
Quando o transporte é feito pelos Correios, o pagamento dos impostos se dá de duas maneiras. Para remessas cujo valor não ultrapassa US$ 500, os tributos devem ser pagos no ato de retirada das mercadorias, na própria unidade de serviço postal. Se o valor for maior que US$ 500, é preciso preencher formulário e apresentá-lo à Receita Federal. É a Declaração Simplificada de Importação (DSI), disponível no site da Receita (http://goo.gl/ivv4V).
Se o transporte for realizado por outra empresa (por exemplo, empresas de transporte internacional expresso, do tipo "porta a porta"), é ela quem deve pagar o imposto à Receita Federal. Assim, ela cobrará essa quantia do consumidor.
Outra orientação é verificar prazos de entrega e condições e preços do frete. Normalmente, o envio da mercadoria demora meses. É comum que os sites forneçam "código rastreador", para verificar se o produto já foi expedido, se já saiu do país de origem ou se já chegou ao Brasil. Mas nem sempre as empresas encarregadas do transporte usam o mesmo código.
É importante imprimir ou guardar todos os documentos que atestam a compra, como número e confirmação do pedido, comprovante de pagamento, contrato ou anúncios. Nas compras acima de US$ 3 mil o regime de tributação não é o simplificado: além do Imposto de Importação, há a incidência de tributos como IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e PIS-Cofins (Programa de Integração Social e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social).
Também é interessante considerar as especificações técnicas do produto, pois nem sempre são as mesmas exigidas no Brasil. Isso vale principalmente para eletrônicos. Além disso, é sempre bom poder contar com uma rede de assistência técnica presente em solo nacional. Caso contrário, consertar um produto com defeito pode ser quase impossível.
O advogado do Idec lembra que, caso determinada marca esteja no Brasil, ela responde pelos defeitos. "O fornecedor que tem representatividade internacional, e que atua no mercado nacional, está sujeito às regras do CDC, mesmo que o produto adquirido não seja vendido ou produzido aqui. É dever da empresa prestar assistência técnica e, se necessário, enviar o bem para fora do país, para que ele seja consertado", concluiu Christian Printes.