Secretaria para defender consumidores
Cidinha Campos, 70 anos, eleita deputada seis vezes (duas como federal e quatro como estadual), sempre pelo PDT, assumiu em fevereiro a Secretaria Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor do Rio de Janeiro, criada no início do ano pelo governador Sérgio Cabral. É a sua primeira experiência no Executivo. Nesta entrevista, Cidinha, que trabalhou como atriz (integrou a “Família Trapo”, um dos principais humorísticos da TV brasileira), repórter (Fantástico, da Rede Globo), radialista (rádios Tupi, Jovem Pan, Bandeirantes) e apresentadora (TVs Tupi, Bandeirantes, CNT), fala do desafio de transformar o Estado do Rio de Janeiro em “uma referência no tratamento ao consumidor”.
Idec: Qual a principal experiência do Legislativo, como presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), a senhora levou para o Executivo, na Secretaria?
CIDINHA CAMPOS: O atendimento móvel foi uma grande sacada da nossa administração à frente da Comissão de Defesa do Consumidor, na Alerj. Ficou claro o que eu já desconfiava: muitos consumidores deixam de reclamar os seus direitos por falta de tempo ou até de recursos para se deslocarem dos seus bairros. Ou seja, os Procons têm de ir até os consumidores.
Idec: A senhora afirmou o Rio de Janeiro trata muito mal os consumidores. O que tem feito para que produtores, estabelecimentos comerciais e concessionárias de serviço público melhorem o atendimento?
CC: Aqui, na sede do Procon-RJ, os prazos de atendimento já diminuíram. As audiências de conciliação foram agilizadas e as autuações dos fiscais, que estavam praticamente paradas, estão funcionando a pleno vapor.
Idec: O que foi acertado com a secretária Nacional de Defesa do Consumidor, Juliana Pereira, na reunião que realizaram para discutir a atuação conjunta nos grandes eventos que o Rio terá — Copa das Confederações, Jornada Mundial da Juventude, Olimpíadas e Copa do Mundo?
CC: Ficou estabelecido que os Procons criariam Câmaras de Gestão de Crise, com representantes de vários setores, para resolver os problemas dos consumidores durante os eventos. Independentemente disso, estamos nos reunindo com setores que serão muito demandados, como, por exemplo, bares, restaurantes, empresas de telefonia e empresas fornecedoras de energia elétrica. Com o sindicado de hotéis fizemos uma cartilha que será distribuída em todos os estabelecimentos.
Idec: A senhora avalia que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) ainda não é integralmente cumprido, apesar de ser uma das leis mais respeitadas. O que é necessário para que o CDC seja uma realidade para consumidores e fornecedores?
CC: Os fornecedores de serviços e os comerciantes ainda não respeitam integralmente nem sequer o direito à segurança dos consumidores, uma vez que a higiene ainda é precária. O controle de validade dos produtos é negligenciado. Já encontramos estabelecimento que tinha gato dormindo em cima de um saco de feijão. Quando perguntado se não sabia que era anti-higiênico, o proprietário respondeu: “Eu botei o gato para espantar os ratos”.
Idec: O Rio de Janeiro é uma das cidades com o maior número de idosos no Brasil, segundo o censo do IBGE. O que é necessário para o cumprimento efetivo do Estatuto do Idoso?
CC: O que falta, acima de tudo, é a conscientização do respeito que os idosos merecem e têm direito. Fizemos uma operação para obrigar as empresas de ônibus a conceder a gratuidade no transporte. Sete motoristas foram presos por não parar aos idosos. Mas poderíamos ter prendido 200. Principalmente os donos das empresas, que se não instruem seus motoristas nessa prática criminosa, no mínimo, a admitem. Porém, não dispúnhamos dos recursos necessários. Deixaríamos o trânsito caótico, a cidade sem ônibus e entupiríamos as delegacias.
Idec: O Rio é o Estado que mais atrai turistas estrangeiros. O que é necessário para melhorar o atendimento aos visitantes?
CC: A prefeitura está dando atenção especial aos lugares turísticos. O que mais atrapalha o Rio são os seus aeroportos. O Tom Jobim está uma vergonha. A Infraero não fez o seu dever de casa. Nem com a “ajuda dos universitários” vai fazer até o início dos eventos.
Idec: A senhora propôs um projeto de lei, sancionado pelo governador, que obriga casas de shows, teatros, cinemas e demais estabelecimentos voltados ao entretenimento público a disponibilizarem assentos especiais para pessoas obesas. Essa lei é cumprida?
CC: Não. Agora mesmo cinemas foram autuados pela ausência desses assentos especiais. Os teatros e as casas de shows também serão fiscalizados.
Idec: Qual a avaliação que a senhora faz do Plano Nacional das Relações de Consumo e Cidadania (Plandec), anunciado recentemente pelo governo federal?CC: O CDC foi a grande lei em defesa dos consumidores, mas ainda é ignorada por grande parte dos fornecedores de produtos e serviços. O Plandec, em boa hora, dá mais força aos Procons ao lhes dar o direito de decidir questões hoje somente atribuídas ao Judiciário. Algumas das nossas decisões serão acolhidas pela Justiça como título executivo extrajudicial.
Idec: Na sua opinião, que produtos devem ser considerados essenciais, conforme estabelece o Plandec, lançado em 15 de março?
CC: Todos da linha branca, os necessários à saúde do consumidor e os necessários ao desempenho da atividade profissional.
Idec: A cobrança da consumação mínima em bares, danceterias, restaurantes e casas noturnas é prática abusiva e ilegal. Alguns Estados proibiram a prática por meio de leis estaduais. Essa lei é cumprida no Rio de Janeiro?
CC: No Rio de janeiro a cobrança da consumação mínima é proibida por uma lei estadual (Lei 5.497, de 17 de agosto de 2012). O consumidor não deve aceitar esse tipo de cobrança, e se for constrangido a fazê-lo, deve exigir a nota e procurar um órgão de defesa do consumidor.
Idec: A Lei 6.322/12, publicada no Diário Oficial do Executivo no ano passado, obriga as empresas a anunciarem o direito ao arrependimento, que dá ao cliente sete dias para voltar atrás e desistir de compras feitas por telefone ou internet. Como fazer para que essa nova lei do Rio de Janeiro, que trata de um tema já disciplinado pelo CDC, seja cumprida?
CC: Para que esta lei seja cumprida vamos continuar fiscalizando e punindo. Infelizmente, no Brasil, fornecedores somente aprendem quando dói no bolso.
Idec: Como parlamentar, a senhora sempre foi um dura crítica dos serviços prestados pelas companhias aéreas. O que é necessário para harmonizar o relacionamento entre aéreas, agências de viagens e consumidores?
CC: As companhias aéreas fazem o que querem por inoperância da Anac. O valor da taxa para mudança de voo chega a ser mais caro do que a passagem. A restituição de dinheiro de passagens não usadas, por força maior, é feita depois de meses. Desrespeitam acintosamente os contratos de milhagens, cada vez nos atendem pior nos voos. Na Gol, por exemplo, você somente tem direito a meio copo de água. Isso mesmo: meio. Cancelam voos sem avisar, não dão hospedagem, nem alimentação para passageiros que ficam esperando. Somente nos resta apelar à Justiça. Meu marido, por exemplo, acaba de ganhar uma ação contra a Aerolíneas Argentinas. Os consumidores caem em cima das agências de viagem, seu elo mais próximo, enquanto isso a Anac continua planando em céu de brigadeiro. Uma vergonha.
Idec: A senhora foi criticada por nomear uma sobrinha para cargo comissionado na secretaria de comanda. Qual a justificativa para uma nomeação que a deixou exposta à acusação de nepotismo?
CC: Eu cumpro rigorosamente a lei antinepotismo, que permite a contratação de parente de quarto grau. A contratada tem uma larga experiência na defesa dos consumidores, em que atua há mais de dez anos.