A Justiça está sendo feita
Outros tributos
Também em 1986, o Banco Central estabeleceu a cobrança de 25% sobre o valor das passagens aéreas e marítimas e de moeda estrangeira, só que camuflou o tributo sob o nome de “encargos financeiros”. “A exigência de dinheiro por parte do governo sem que o cidadão tenha cometido um ato ilícito, que configuraria pena ou multa, só pode ser um tributo”, informa Printes. “No entanto, a criação de tributo deve ser feita através de lei específica, não pode ser exigida através de uma resolução do Banco Central. Logo, a cobrança é ilegal”, completa Mendes. Assim, pipocaram mais ações judiciais de julho de 1986 a dezembro de 1987, entre as quais as movidas pelo Idec em benefício de seus associados.
Quando as primeiras ações referentes a esses tributos foram propostas, pairava uma dúvida sobre quem seria o responsável por devolver os valores pagos pelos consumidores: a União Federal, por ter recebido o dinheiro, ou o Banco Central, por ter lançado a resolução que ilegalmente instituiu o tributo indevido. Em 1991, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) pôs fim à dúvida, publicando uma súmula que considerou o Banco Central responsável pelo ressarcimento. No entanto, algumas ações sobre o tema contra a União caíram por terra. Foi o caso de oito processos propostos pelo Idec.
Saiba mais
-Informações sobre os processos judiciais movidos pelo Idec www.idec.org.br/consultas/acoes-judiciais
-Esta matéria faz parte da série Ações do Idec, publicada desde a edição de abril. Os outros temas abordados foram:
1. Planos econômicos (“Tudo sobre planos econômicos”, edição nº 164)
2. Planos de saúde (“Direito à saúde”, edição nº 165)
3. Consórcios (“Consórcios problemáticos”, edição nº 166) Casos de sucesso
No total, o Idec ajuizou 217 ações em litisconsórcio ativo (chamadas pelo Idec de “grupo restrito”) e duas ações coletivas em favor de seus associados para o reembolso de empréstimos compulsórios. Ainda hoje, 23 anos depois dos primeiros processos sobre o tema, alguns deles continuam em andamento. Mas grande parte já foi julgada e o saldo é bastante positivo para os consumidores. “As ações sobre empréstimos compulsórios têm sido vitoriosas, pois a maioria foi julgada procedente e muitos associados já foram reembolsados. Sem contar que diversas ações estão tramitando na Justiça em fase de execução e outros associados em breve receberão os valores a que têm direito”, ressalta Daniel Mendes, advogado do Instituto. Apenas as ações coletivas, que foram ajuizadas mais recentemente, em 1996, a fim de beneficiar os associados do Instituto que não participaram dos processos anteriores, ainda estão em fase menos adiantada de discussão na Justiça e devem demorar um pouco mais para terem resultado definitivo. Confira mais detalhes sobre as ações do Idec no quadro abaixo.
A declaração de ilegalidade e inconstitucionalidade dos empréstimos compulsórios de veículos e combustíveis pelo Supremo Tribunal Federal (STF) – órgão máximo do Poder Judiciário no país –, em 1992, deu maior força às ações dos contribuintes e também favoreceu o sucesso dos processos do Idec. A decisão obrigou o Senado Federal a lançar a Resolução no 50/1995, garantindo que a devolução não fosse realizada por meio de cotas do FND, mas sim em dinheiro.
O Idec moveu mais de 200 ações para garantir aos consumidores o ressarcimento dos empréstimos compulsórios efetuados na compra de veículos e combustíveis no fim dos anos 80, e dos tributos pagos na aquisição de passagens aéreas e moeda estrangeira. Muitos já receberam seu dinheiro de volta
A segunda metade da década de 1980 foi marcada por grave crise econômica no país, em decorrência da enorme inflação que castigava os brasileiros. A tentativa de controlar a situação desencadeou uma série de medidas desesperadas por parte do governo federal. Uma delas foi a aprovação, pelo então presidente José Sarney, do Decreto-Lei no 2.288, em 1986, que instituiu o empréstimo compulsório sobre a venda de veículos e de combustíveis, que nada mais era que um tributo, cobrado através da inclusão de percentuais sobre o preço desses produtos: de 10% a 30% para os automóveis com até quatro anos de fabricação, e de 28% sobre o valor do álcool e da gasolina. “O objetivo do compulsório era reduzir a liquidez do mercado, inibindo a aquisição de produtos e serviços e, por consequência, o aumento dos preços”, explica Christian Printes, advogado do Idec.
O nome “empréstimo” só se justificava porque a lei que criou o tributo previa a devolução dos valores pagos pelos consumidores de julho de 1986 a outubro de 1988. Segundo a norma, o reembolso seria feito através de cotas do recém-criado Fundo Nacional de Desenvolvimento (FDN) a partir de julho de 1989. No entanto, a promessa não foi cumprida, o que gerou uma avalanche de ações judiciais contra a União Federal. No mesmo ano, o Idec entrou com os primeiros processos para garantir que seus associados recebessem de volta a quantia“emprestada” no momento da aquisição de veículos, e em 1991 vieram as primeiras ações sobre o tributo inserido no preço dos combustíveis.
Entenda o que significam alguns dos termos jurídicos que aparecem nesta e em outras reportagens sobre ações judiciais. As expressões abaixo explicadas foram destacadas ao longo do texto.
-Ação em litisconsórcio ativo (“grupo restrito”): é um tipo de ação promovida por vários autores em benefício exclusivo deles, ou seja, apenas os indivíduos citados no processo poderão se beneficiar da decisão judicial. Como as sentenças são individuais, o direito de um membro do grupo pode ser reconhecido, e o de outro não.
-Ação coletiva: é movida para reconhecer o direito coletivo de uma comunidade ou grupo de pessoas. Por exemplo, uma ação coletiva movida pelo Idec visa beneficiar todos os seus associados.
-Fase de execução: quando o direito já foi reconhecido definitivamente, a execução é o momento em que o pagamento da quantia devida é efetuado. Pode haver discussões a respeito do valor a ser ressarcido — mas nunca sobre o direito à indenização —, o que pode retardar o pagamento aos beneficiários.
-Recurso: é o pedido de revisão de uma decisão judicial desfavorável, que pode ser feita ao próprio tribunal que proferiu a sentença ou a uma instância superior.
-Súmula: é a declaração de um entendimento pacífico ou majoritário adotado por um Tribunal a respeito de um tema. A súmula serve de orientação para futuros julgamentos envolvendo situações semelhantes.