Seu dinheiro
A pandemia de Covid-19 deixou bem clara a importância de se fazer um planejamento financeiro e ter uma reserva de emergência para situações como a que estamos vivendo. Veja dicas de especialistas
Que passaremos por uma crise financeira global é fato. O que não é possível prever ainda é a sua dimensão. Alguns especialistas mais otimistas acreditam que podemos recomeçar a crescer no final de 2021, já os mais pessimistas projetam para 2025 a recuperação econômica.
Mas já podemos tirar pelo menos uma lição da pandemia de Covid-19: a importância de fazer um planejamento financeiro e ter uma reserva de emergência. "Quem vivia no piloto automático, gastando tudo o que ganhava, chegou à conclusão, pela dor, que não é mais possível viver a vida como canta Zeca Pagodinho: 'Deixa a vida me levar, vida leva eu...' ", afirma a educadora financeira Carol Stange, que tem 1 milhão de inscritos em seu canal no Youtube. "O dinheiro da reserva de emergência deve estar investido numa aplicação segura, que não sofra grandes oscilações e que tenha liquidez diária, ou seja, de onde você possa retirá-lo a qualquer momento. E não basta ter um trocadinho. É preciso ser uma quantia robusta que cubra os seus gastos mensais por certo tempo", defende Evelin Bonfim, consultora de finanças pessoais para mulheres. Maiara Xavier, educadora financeira por trás do canal "A Rica Simplicidade", que tem 244 mil inscritos no Youtube, concorda com as colegas e acrescenta outros aprendizados: entender o que é essencial e do que você pode abrir mão; ter mais de uma fonte de renda, pois se colocar todos os ovos numa única cesta, se a fonte secar, ficará sem receita; e evitar financiamentos longos (o ideal é juntar o dinheiro para comprar o que deseja. Se for preciso financiar, que seja uma pequena parte).
Stange sugere que aproveitemos o isolamento social para analisar o orçamento e pensar se queremos continuar trocando o nosso dinheiro por coisas. "Deveríamos priorizar o ser em vez do ter, pois somos resultados das nossas experiências (tendemos a nos lembrar muito mais delas do que de mais um sapato que foi comprado sem necessidade)", ela opina. Bonfim pensa parecido: "Tem muita coisa que a gente acha superimportante, mas que a pandemia nos mostrou que não é tão imprescindível assim. Agora, vemos que o que é essencial mesmo é a nossa segurança, a nossa paz, o amor da nossa família e a harmonia em casa".
PLANEJAMENTO FINANCEIRO: COMO FAZER
Para quem ainda não tem um planejamento financeiro, este é o momento ideal para implementar esse hábito. "O planejamento financeiro nada mais é do que juntar dinheiro para fazer o que você quer. É muito simples, mas na hora de colocar em prática muita gente tem dificuldade", explica Bonfim. Para isso, você vai precisar de uma planilha financeira. O Idec acaba de atualizar o seu modelo, que pode ser baixado em https://idec.org.br/ planilha/download.
CONHECIMENTO NUNCA É DEMAIS
Carol Stange, Evelin Bonfim, Maiara Xavier e Ione Amorin compartilham algumas dicas:
Livros
- A rica simplicidade, de Maiara Xavier;
- Casais inteligentes enriquecem juntos, de Gustavo Cerbasi;
- Ganhar mais, gastar menos e investir melhor, de Denise Damiani;
- Investindo em ações no longo prazo – o guia indispensável do investidor do mercado financeiro, de Jeremy J. Siegel;
- Me Poupe – 10 passos para nunca mais faltar dinheiro no seu bolso, de Nathalia Arcuri;
- Pai rico, pai pobre, de Robert T. Kiyosaki;
- Pare de ganhar mal – manual de negociação para aumentar seu salário e sua qualidade de vida, de Breno Paquelet;
- Os segredos da mente milionária, de T Hary Eker.
Cursos
As instituições abaixo oferecem opções pagas e gratuitas para quem quer aprender conceitos básicos de economia, como investir etc.
- Canal "Cidadania Financeira", do Banco Central: https://bit.ly/3df8I7J;
- Conselho Monetário Nacional (CMN): https://bit.ly/2xuDhad;
- Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima): https://bit.ly/2KTLpnw;
- B3: https://bit.ly/2ypM0L7.
Com a planilha em mãos, o primeiro passo é entender a sua realidade financeira, ou seja, quais são os seus gastos, quais são as suas receitas e quanto custa a sua vida todos os meses. Stange recomenda separar as despesas em essenciais (das quais a sobrevivência depende: água, luz etc.), negociáveis (aluguel, financiamento bancário, de carro ou imóvel etc.) e postergáveis (nunca é bom ficar sem pagar uma conta, mas quem estiver totalmente sem renda pode adiar alguns pagamentos). Feito esse mapeamento, você visualizará se está sobrando dinheiro e, se não estiver, o que é possível cortar.
O segundo passo é olhar para os meses seguintes, registrar quanto vai receber e estabelecer um teto de gasto para cada item variável (alimentação, transporte, lazer etc.). Para Xavier, é importante, nessa etapa, definir quanto será investido na sua reserva de emergência (caso ainda não tenha), na sua aposentadoria e nos seus objetivos (comprar carro, reformar a casa, viajar etc.). "Então, você tem de pesquisar quanto custa cada objetivo e definir uma meta, ou seja, quanto será preciso guardar por mês e por quanto tempo. Paciência e disciplina são necessárias, porque pode levar meses ou anos dependendo do projeto, mas é assim que se consolida um planejamento sem comprometer as finanças", ela ensina.
ENDIVIDAMENTO, UMA REALIDADE
Se o endividamento já era elevado antes do novo coronavírus aparecer (63 milhões de brasileiros, segundo dados da Serasa Experian), irá piorar quando tudo isso passar, infelizmente. O que, então, os endividados podem fazer? Primeiramente, é preciso tentar renegociar alguns contratos, como financiamento de automóvel ou imóvel, crédito consignado, aluguel e até cartões de loja. Contudo, isso não é tão simples assim, já que alguns credores são pessoas físicas e também estão sendo impactados. "Eu recomendo apresentar uma proposta à pessoa ou empresa para a qual você está devendo, pois por mais que todo mundo esteja sendo afetado, está rolando bastante empatia", diz Xavier.
Quem deve para bancos não está em situação melhor. Isso porque as regras para a suspensão das dívidas e eliminação de encargos anunciada pelos cinco maiores bancos do país não são claras, e essa medida só beneficia quem está com o pagamento em dia. Assim, ela vai mudar a realidade de pouca gente. Além disso, Amorim, do Idec, destaca que ficaram de fora as modalidades de crédito que concentram o maior índice de inadimplência entre as famílias mais pobres: cheque especial, cartão de crédito e crédito consignado. "É preciso ficar bastante atento às propagandas que dizem: 'estamos ao seu lado nessa crise, vamos suspender o pagamento das dívidas por 60, 90, 120 dias', porque tem muita gente que percebeu que o valor das parcelas ou a taxa de juros aumentou após o pedido de suspensão", adverte Bonfim.
Amorim preocupa-se com os direitos dos consumidores, que estão sendo negligenciados. "O Código de Defesa do Consumidor está sendo desrespeitado em relação ao direito à informação, à clareza nas propostas feitas pelos bancos e nas cláusulas contratuais sobre a suspensão das dívidas. O consumidor não sabe ao certo as responsabilidades que está assumindo", declara. Em defesa dos cidadãos brasileiros, o Idec enviou uma carta ao Ministério da Economia e ao Banco Central cobrando que olhem para os consumidores com a mesma urgência que olharam para as instituições financeiras e as grandes empresas, que foram as mais assistidas até o momento (leia mais no Idec em Ação, na página 34). Estamos aguardando.