Perigo invisível
Saiba quais substâncias químicas estão presentes em produtos usados no dia a dia, os riscos que oferecem e como reduzir sua exposição a elas
Você já parou para pensar na quantidade de substâncias químicas presentes nos produtos que utiliza no dia a dia? Elas estão em absolutamente tudo o que usamos: produtos de limpeza, roupas e sapatos, alimentos, brinquedos, eletrônicos e muito mais.
Muitas delas podem causar danos à saúde dos consumidores, dos trabalhadores da linha de produção e também ao meio ambiente — das substâncias usadas em xampus a agrotóxicos, tudo pode parar no lençol freático, contaminando a água e o solo.
O contato com químicos pode provocar intoxicação aguda (que se manifesta logo após a exposição), com reações alérgicas, por exemplo, ou crônica, que aparece a longo prazo, na forma de doenças como câncer.
Pelo risco que representam, muitos compostos químicos só podem ser utilizados dentro de limites determinados por lei. "Contudo, infelizmente, não há uma norma estruturante para o tema no Brasil. A Política Nacional de Segurança Química ainda está em discussão", lamenta Renata Amaral, pesquisadora do Idec.
Para se prevenir, o primeiro passo é saber que o perigo existe. A seguir, listamos os efeitos de algumas substâncias presentes em produtos do dia a dia e, sempre que possível, alternativas para fugir delas.
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ROUPAS
O uso de químicos começa já na plantação de algodão, que recebe agrotóxicos para controle de pragas; na produção do tecido em si, outros químicos são utilizados, como no processo de tingimento. Algumas substâncias tóxicas usadas nas roupas são: alquilfenol e nonilfenol; ftalatos; polifluorcarbonos; corantes dispersos alergênicos; e metais pesados (chumbo, cádmio, mercúrio, cromo e níquel), por exemplo.
• Riscos para a saúde: os riscos de intoxicação por meio do contato da pele com o tecido são, em geral, bem pequenos. Mas bebês, por exemplo, podem ser intoxicados porque chupam as roupas. Para quem trabalha na linha de produção, o risco de contaminação é significativo, sobretudo pelo uso de agrotóxicos na plantação de algodão. O consumo de água ou alimentos contaminados com os químicos usados em roupas pode causar distúrbios hormonais, alterações no sistema reprodutivo e nervoso, alterações genéticas, problemas na medula óssea e nos rins, câncer de pulmão e próstata e doenças degenerativas, por exemplo.
• Alternativas: uma das poucas opções é escolher tecidos com tingimentos naturais e fibras orgânicas, mas o uso desses materiais e processos no setor têxtil ainda é raro.
Fontes: Lourival dos Santos Flor, do Comitê de Química Têxtil da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit)
PRODUTOS DE LIMPEZA
Repletos de químicos, os produtos de limpeza doméstica são a terceira principal causa de intoxicação no país, segundo os dados mais recentes do Sistema Nacional de Informações Tóxico Farmacológicas (Sinitox), da Fundação Oswaldo Cruz, de 2012. Eles responderam por 8% dos casos, atrás de medicamentos (27%) e de picadas de escorpião (12%).
• Riscos para a saúde: são diversos. Vão desde irritação na pele, causado pela soda cáustica (presente em desentupidores, limpadores de forno, detergentes e limpadores multiuso); problemas respiratórios provocados pelo hipoclorito (água sanitária); até efeitos mais graves, como alterações no sistema nervoso pelo contato com xileno, tolueno e etilbenzeno (usados em produtos de limpeza em geral); intoxicações graves, no caso de inalação ou ingestão acidental de cloro (alvejantes); e câncer, associado ao benzeno (usado em solventes, repelentes, inseticidas, ceras líquidas e removedores).
• Alternativas: a principal é utilizar produtos de limpeza ecológicos, feitos com ingredientes como bicarbonato de sódio, vinagre e limão. Há receitas para preparo caseiro de produtos diversos (veja algumas no link bit.ly/faxinaecologica). Caso mantenha o uso dos convencionais, utilize luvas para manipular detergentes, limpadores multiuso e, principalmente, desentupidores e limpadores de forno; abra as janelas quando usar água sanitária; não misture produtos, pois isso pode provocar reações explosivas ou vapores tóxicos (por exemplo, hipoclorito com amoníaco); leia o rótulo; siga as instruções do fabricante; e não reutilize a embalagem.
Fontes: Marcia Gimenez, médica do Centro de Controle de Intoxicações da Prefeitura de São Paulo, e Marília Natale Girotto, subgerente da Vigilância de Produtos da Coordenação de Vigilância em Saúde (Covisa)
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As substâncias químicas presentes na comida podem ter diferentes origens: a aplicação de agrotóxicos no plantio, os compostos utilizados no processo de industrialização e até as embalagens em que são acondicionadas. Veja alguns exemplos:
• Riscos para a saúde:
Agrotóxicos: entre os danos agudos, mais comuns em agricultores, estão: enjoo, diarreia, dor de cabeça, irritação nos olhos e na pele e até óbito. Já os danos crônicos incluem neuropatias, problemas imunológicos, alterações das funções hormonais e reprodutivas, e câncer. "Em uma mesma planta são utilizados vários agrotóxicos. Os impactos dessas misturas são imprevisíveis, mas provavelmente muito mais danosos", alerta Vicente Soares de Almeida, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).
Corante tartrazina-amarelo (usado em iogurte, gelatina, refrigerante, biscoitos, balas, entre outros): pode causar reações alérgicas, como asma, bronquite e rinite; náuseas; broncoespasmo; urticária, dermatite e dor de cabeça. Em crianças, pode provocar insônia e falta de concentração. Os produtos que usam esse corante são obrigados a apresentar frase de alerta no rótulo.
Corante Caramelo IV (refrigerantes, energéticos, sucos, biscoitos, cereais matinais, granola etc.): no processo de elaboração do Caramelo IV, são gerados dois subprodutos – 2-metilimidazol e 4-metilimidazol–, cancerígenos em animais.
Bisfenol A – BPA (presente em embalagens metálicas e plásticas): altera as funções reprodutivas e a imunidade, reduz a produção de esperma, diminui a fertilidade e pode provocar câncer nos testículos e na próstata, segundo estudos com animais. Diante dos riscos, seu uso é proibido em mamadeiras no Brasil desde 2011.
Ftalatos (presentes no plástico-filme que envolve e veda embalagens de carnes, pizzas e queijos): mesmo em concentrações pequenas, a exposição por tempo prolongado pode causar problemas no sistema reprodutor masculino.
Nitrosaminas – nitritos e nitratos (conservam carnes defumadas ou curadas – salsichas e embutidos em geral – e evitam a ação de micro-organismos em queijos): câncer e tumores na região bucal, nos sistemas respiratório e digestivo, na bexiga e no cérebro.
• Alternativas: consumir alimentos orgânicos, que não usam agrotóxicos (saiba mais em: www.feirasorganicas.org.br); evitar embutidos e produtos ultraprocessados, principalmente os que contêm corantes artificiais; preferir embalagens com o selo "BPA free"; evitar esquentar comida em embalagens plásticas; não envolver alimentos em plástico-filme.
Fontes: Ana Paula Bortoletto, nutricionista do Idec; e Embrapa
APARELHOS ELETRÔNICOS
Os eletrônicos são "repositórios" de substâncias tóxicas, como lítio e magnésio (presente em bateria de celular), chumbo (monitor de computador, televisão e celular) e mercúrio (aparelho de xerox, scanner, impressora com scanner, monitores de LCD). Se descartados no lixo comum e acabarem em lixões e aterros, podem contaminar a água e o solo.
• Riscos para a saúde: o uso de eletrônicos em si não oferece risco. No entanto, o consumo de água e de alimentos contaminados pelas substâncias tóxicas neles presentes tem efeito cumulativo e pode causar câncer, alterações genéticas, problemas no sistema nervoso, na medula óssea e nos rins, demência e doenças degenerativas, por exemplo.
• Alternativas: a melhor atitude em relação aos eletrônicos é descartá-los corretamente: devolvendo-os aos fabricantes; encaminhando-os para a reciclagem; ou, se estiverem funcionando, doando-os. Quem mora em São Paulo (SP) pode levar os aparelhos ao Centro de Descarte e Reúso de Resíduos de Informática, do Centro de Computação Eletrônica da Universidade de São Paulo (USP). Para mais informações, ligue: (11) 3091-6454/6455/6456.