A quem pertence a água?
Título: A vida engarrafada (Bottled Life – The Truth About Nestlé Business)
Gênero: documentário
Direção: Urs Schnell
Roteiro: Urs Schnell e Res Gehriger
Ano: 2012
Duração: 90 minutos
Onde assistir: no Netflix
por CARLOS THADEU DE OLIVEIRA*
O título original do documentário Bottled Life – The Truth About Nestlé Business já traz uma crítica ao principal produto da Nestlé no mercado de águas, a Pure Life, no Brasil chamada de Pureza Vital. Traduzido como A vida engarrafada, o premiado documentário é devastador para a maior multinacional de alimentos e bebidas.
Logo de início, o filme desmascara a farsa da Nestlé em relação à instalação de um sistema de água potável em um acampamento de refugiados na Etiópia. A iniciativa humanitária é propagandeada no site global da companhia, com direito a depoimentos emotivos de seu diretor executivo, Peter Brabeck. No entanto, funcionários do local revelam de forma clara: a empresa não deu mais as caras por lá desde 2004 (as cenas são rodadas em 2011). Equipamentos enguiçados e desgastados e, consequentemente, falta de água.
Em seguida, o enredo segue para o estado do Maine (EUA), onde mostra o litígio da companhia com três pequenas cidades, uma das quais já tem drenados de seu subsolo um milhão de litros de água por dia, futuras garrafas da famosa marca Poland Springs.
Entre favoráveis e contrários à exploração, emerge uma consciência: esses americanos se dão conta de que a regulação local e os dirigentes políticos são absolutamente moldáveis aos interesses das grandes corporações, o que os leva a atuar no que chamam de "campo dos direitos", isto é, brandir com a Constituição contra os decretos municipais e leis estaduais. "No Maine é lícito e legal roubar!", afirma uma moradora da cidade de Fryeburg diante da decisão da Suprema Corte do Estado em favor da Nestlé. A saber: a empresa não paga um centavo pela água do subsolo pois a lei estadual entende que o proprietário do terreno tem direito ao subsolo!
No Paquistão e na Nigéria, a Nestlé também recorre aos governantes para explorar fontes subterrâneas e piorar ainda mais as condições da rede pública. Poços secam, investimento zero em rede pública, e tifo, hepatite e cólera se espalham com a mesma rapidez que surge o signo salvador e seguro: uma garrafa de Pure Life – que, ali, custa mais do que um litro de gasolina ou um dia de trabalho dos cidadãos.
Por isso, Brabeck conclui que "a água é, indiscutivelmente, um direito humano, mas como se dá o acesso a ela? Os governos não conseguem fazer isso. Já a Nestlé valoriza a água, ela nos assegurou 140 anos de vida".
*Gerente técnico do Idec