Entregas vagarosas
Pesquisa do Idec revela que os prazos de entrega prometidos pelos Correios para o serviço de encomenda expressa, o Sedex, nem sempre são cumpridos
"Mandou, chegou". É com esse slogan que os Correios tentam propalar seu serviço de entrega expressa, o popular Sedex. Para verificar se o bordão publicitário está de acordo com a realidade, o Idec foi a campo e enviou documentos a várias cidades do Brasil. Ao todo, foram 14 remessas, todas enviadas da capital paulista, contemplando as cinco regiões do país. O resultado é negativamente surpreendente: houve atrasos em cinco delas (35,7%). Ou seja, o slogan é apenas parcialmente verdadeiro. O mais adequado, que nos perdoem os publicitários, seria algo mais ou menos assim: "Mandou, chegou – mas não necessariamente no prazo prometido".
O Idec avaliou o cumprimento de prazos de três modalidades de Sedex: o Hoje (entrega prometida para o mesmo dia da postagem), o Sedex 10 (promessa de entrega para até as 10 horas do dia seguinte) e o Sedex "normal", cujas datas máximas de entrega variam de acordo com o destino. Veja os resultados na tabela da próxima página.
Dados do Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec), que reúne atendimentos de 25 Procons estaduais e 222 municipais, mostram que o resultado do levantamento do Idec não é um caso isolado: "não entrega/demora na entrega" é a queixa mais comum relacionada aos Correios. Entre janeiro e junho deste ano, foram registradas 199 demandas a respeito. No ano passado inteiro, foram 282.
Entre 9 e 12 de setembro, o Idec testou as três principais modalidades de serviço de entrega expressa dos Correios: Sedex normal, Sedex 10 e Sedex Hoje, para oito cidades das cinco regiões do país: Belém (PA), Campinas (SP), Feira de Santana (BA), Goiânia (GO), Londrina (PR), Mauá (SP), Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP). Foram cinco envios para o Sedex normal e o Sedex 10 e quatro para o Sedex Hoje, totalizando 14 postagens, todas originadas da cidade de São Paulo, mas de diferentes agências. Os endereços de destino foram fornecidos por voluntários, que, cientes da pesquisa, se comprometeram a não se ausentar durante o período em que deveria ser feita a entrega e a registrar dia e horário de chegada das correspondências.
Em todas as situações foi respeitado o horário máximo de postagem. O prazo de entrega considerado para cada envio foi obtido por meio de uma pesquisa prévia no site dos Correios, onde existe um simulador de preço e prazo para cada trecho desejado. O período também foi informado oralmente pelos funcionários das agências no momento de cada postagem.
Por fim, o Idec entrou em contato com o SAC dos Correios, a fim de avaliar o processo de reembolso dos valores de envios com atraso.
TEMPO É DINHEIRO
O caso mais emblemático de atraso ocorreu com um envio para a cidade do Rio de Janeiro, por meio do Sedex 10. O documento foi postado em 9 de setembro e deveria ter chegado até as 10 horas da manhã do dia seguinte. Mas a entrega só foi feita em 12 de setembro, às 13h. Mais de dois dias de atraso. Pode parecer pouco, mas, em se tratando de um serviço cujo principal atrativo é a suposta rapidez, um atraso dessa monta é uma eternidade. A demora foi tão grande que um envio de Sedex normal, postado na mesma data e para o mesmo endereço, chegou antes (também com atraso, é verdade, mas de um dia – chegou em 11 de setembro).
O detalhe é que quanto mais "rápido" o serviço promete ser, mais caro ele é. O Sedex 10 enviado à capital fluminense custou R$ 32,10, enquanto a modalidade "normal" para o mesmo destino saiu por R$ 24,55 – isso porque se tratava apenas de um envelope com uma folha de sulfite dentro, perfazendo menos de 30 gramas. Se o peso fosse maior, seria ainda mais caro. O valor mais alto foi verificado no envio de Sedex Hoje também para o Rio de Janeiro: R$ 68,70, também para um envelope com uma sulfite.
Outro caso de atraso que chama a atenção é o de um Sedex Hoje que tinha São Paulo (capital) como origem e destino, postado em 9 de setembro. O prazo de entrega era, evidentemente, o mesmo dia. Mas a carta só chegou na manhã do dia seguinte. A distância entre a agência onde foi feita a postagem e o endereço de destino era de pouco mais de três quilômetros. Não que essa seja uma agravante (afinal, missão dada deveria ser sempre missão cumprida, independentemente da distância), mas chega a ser engraçado imaginar que, se a entrega fosse feita a pé, o tempo da caminhada seria de menos de uma hora. Os Correios levaram quase 24...
Esse caso tem um detalhe a ser considerado, pois seu código de rastreamento trazia a seguinte informação como justificativa: "Entrega não efetuada – carteiro não atendido. Será realizada nova tentativa de entrega". No entanto, o endereço para o qual tal Sedex foi enviado é um prédio residencial com porteiro. Como se tratava de uma pesquisa, ele estava sabendo da entrega e, por isso, não se ausentou em momento algum da portaria. A versão oficial dada pelos Correios, portanto, parece descabida. Pesquisando na internet, aliás, há diversas reclamações parecidas. "Em situações desse tipo, o ônus da prova é da empresa. Ela deve provar que a culpa de o prazo não ter sido cumprido é do consumidor", afirma Mariana Alves Tornero, advogada do Idec.
Os outros dois atrasos verificados foram os dos envios a Belém (PA) e Feira de Santana (BA). Ambos eram Sedex normal. Os prazos máximos de entrega foram excedidos em dois e um dia, respectivamente.
Além de entrega fora do prazo, houve ainda problemas com os códigos de rastreamento de quatro envios. Tal código sempre é gerado no momento da postagem de um Sedex; quando inserido no campo indicado do site dos Correios, ele permite que o usuário consulte o status da entrega. No caso do Sedex 10 enviado ao Rio de Janeiro, a sequência de números e letras remetia a outro envio do Idec, mas para a cidade de Mauá (SP). Já o código da remessa endereçada a Mauá informava o paradeiro de postagem feita a Londrina (PR); a endereçada a Londrina caía nos dados de carta remetida à capital paulista; e o código deste último, que não tinha entrado na história, aparecia simplesmente como incorreto.
Os Correios são uma empresa pública federal, presente em praticamente todos os municípios brasileiros. Essa grande capilaridade a torna a principal fornecedora de serviços de entrega de correspondências do país. Mas não se trata de um monopólio; há outras empresas relativamente grandes no mercado, como a Fedex e a DHL. Estas, porém, são mais focadas em remessas internacionais e/ou voltados a pessoas jurídicas, além de não estarem presentes em todo o território nacional. Por esses motivos, não fizeram parte do escopo da pesquisa. Em todo caso, vale a pena consultar os preços e as condições de oferta das concorrentes dos Correios, para que você possa escolher a opção mais interessante para uma determinada situação de envio.
DINHEIRO DE VOLTA
Segundo o artigo 35 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), é direito do consumidor receber a restituição integral dos valores pagos em caso de descumprimento de oferta – entre eles, o prazo de entrega. No entanto, os Correios preveem, em alguns casos, a devolução apenas parcial do dinheiro em caso de atraso, conforme informado em seu site: 30% (Sedex normal) e 50% (Sedex 10). Quanto ao Sedex Hoje, o site traz a um só tempo duas informações conflitantes: 50% e duas vezes o valor pago. "Essa limitação é abusiva e pode ser contestada pelo consumidor, inclusive na Justiça. A falha na prestação de serviço deve ser traduzida em completa e efetiva reparação dos danos", ressalta a advogada do Idec. Além do ônus do pagamento de um serviço não condizente com a oferta, é possível que o consumidor também tenha outros prejuízos (materiais e morais). "O consumidor pode, sim, exigir indenização por esses danos", diz Mariana.
O site da empresa traz, ainda, uma lista dos "principais motivos que podem impedir o cumprimento dos prazos". Por exemplo, "motivos de força maior (inundação, incêndios, falta de segurança pública, fechamento de estradas ou ruas etc.)" e "dificuldades de acesso a localidades (transporte irregular ou com baixa frequência)". Para o Idec, no entanto, nenhuma justificativa é aceitável. "O risco de haver atraso é do fornecedor, e não do consumidor", explica a advogada do Idec. "A não ser, é claro, que a culpa pelo atraso seja do cliente, por exemplo, se o remetente informar um endereço errado", conclui.
Solicitamos ao SAC o reembolso das cinco remessas que chegaram com atraso, em nome do pesquisador, para simular a situação de um cliente comum do serviço. Até o fechamento desta edição, só houve retorno (por e-mail) para três casos: os do Sedex normal enviados ao Rio de Janeiro e a Belém e a do Sedex 10 enviado à capital fluminense. No entanto, a resposta desse último foi dada depois do prazo de cinco dias úteis prometidos pelo SAC (mais um atraso).
Nos dois casos das remessas ao Rio de Janeiro (Sedex normal e 10), o reembolso foi aprovado, mas, na resposta sobre o Sedex normal, não foi informado qual valor será devolvido (se integral ou parcial), enquanto na do Sedex 10 é dito que o ressarcimento será feito "conforme regras estabelecidas para indenização, presentes no Termo de Prestação de Serviços" – ao que tudo indica, portanto, apenas parcial. No caso do envio a Belém, a mensagem não faz menção a reembolso, diz apenas: "Caro cliente, seu objeto já foi entregue no dia 13/09/2013". Entramos em contato com o SAC por telefone, que informou que a devolução fora aprovada também nesse caso, mas que o valor ainda seria definido. A empresa promete que fará os depósitos entre cinco e dez dias úteis, prazo que não encerrou até o fechamento desta edição.
Há situações ainda mais graves que atrasos: extravios. Imagine, por exemplo, um produto que simplesmente some do mapa. Para situações como essa, existe a opção de o consumidor fazer previamente um seguro da mercadoria, calculado de acordo com o valor declarado (1% desse valor). "Mas, mesmo que o consumidor não tenha contratado o seguro, a empresa deve reparar os danos sofridos", diz Mariana Tornero, advogada do Idec.
Os Correios preveem uma indenização automática para casos de extravio e avaria. O valor varia de acordo com a modalidade de envio: R$ 50 para o Sedex normal e R$ 75 para o Sedex 10 e o Sedex Hoje — valores que podem ser inferiores ao da mercadoria extraviada ou danificada.
Direito de resposta
O Idec notificou formalmente os Correios sobre os resultados da pesquisa. Porém, como o prazo para resposta só encerraria após o fechamento desta edição, contatamos também a sua assessoria de imprensa.
Por meio da assessoria, a empresa disse que a amostra do teste feito pelo Idec (14 encomendas postadas em uma única cidade) "não é suficiente para verificar a qualidade operacional" da empresa. Além disso, justificou que três dos cinco atrasos identificados foram causados por "problemas externos de força maior" — um problema no voo que levava a carga de São Paulo ao Rio de Janeiro na data em que a postagem do Instituto foi feita.
No que diz respeito ao reembolso, a empresa argumenta que, apesar dos atrasos, o serviço de entrega foi atendido e que, dessa forma, a devolução parcial do valor pago não fere o Código de Defesa do Consumidor (CDC). O Idec discorda e reforça que, à luz do CDC, o atraso na entrega é, sim, descumprimento de oferta — ainda mais num serviço cuja lógica é, justamente, a rapidez na entrega.