Conhecido, mas pouco consultado
O PERFIL DE QUEM RECLAMA
Apesar de a maioria dos consumidores ainda não ter adotado o hábito de reclamar, o percentual dos que o fazem também aumentou em relação a 2011. Enquanto no primeiro levantamento apenas 21% dos consumidores disseram registrar queixas sempre que têm um problema de consumo, atualmente um terço (33%) da população já o faz. Morishita acredita que, antes de reclamar, o consumidor avalia o custo-benefício de sua atitude. “Hoje, a maioria da população brasileira vive em centros urbanos, o que significa trabalhar muitas horas por dia e gastar tantas outras no transporte etc. Assim, o consumidor pondera se vale a pena investir o seu pouco tempo para ir atrás de seus direitos”, analisa. No levantamento da FGV, os principais motivos apontados pelos entrevistados para não reclamar foram “não compensa” (37%) e “demora muito” (31%).
Para o professor, esse quadro aponta uma situação ruim para as próprias empresas. “Se o consumidor é prejudicado, mas não reclama, significa que o fornecedor não terá a chance de solucionar o problema, se retratar e ‘recuperar’ esse cliente. Não reclamar é uma condenação sumária da empresa”, ressalta. “É normal haver problemas, o que define a qualidade de uma empresa é a oportunidade que ela dá para a sua reparação”, completa. Oliveira, do Idec, acrescenta que o hábito de reclamar e enxergar nisso uma oportunidade para a resolução de um problema e eventual melhoria de um produto ou serviço também depende da resposta dos fornecedores. “Mas, infelizmente, a tirar pelos dados da pesquisa e dos últimos números dos Procons de todo o país, o consumidor tem avançado mais por sua própria conta nesse aspecto”. Dados do Cadastro Nacional de Reclamações Fundamentadas (que reúne informações dos Procons de todo o país) têm mostrado por seguidos anos que mais de 80% das queixas que chegam aos Procons poderiam ter sido resolvidas de imediato pelas empresas.
A pesquisa Idec/Market Analysis observou a relação entre a familiaridade com os direitos do consumidor de modo geral e o comportamento de reclamar junto aos órgãos de defesa do consumidor. Nesse aspecto, é possível perceber que o conhecimento sobre o tema costuma contribuir com o ativismo efetivo: 32% conhecem e reclamam (o que é chamado de “ativismo informado”); 29% não conhecem e não reclamam. Contudo, há públicos dissonantes: cerca de um em cada quatro brasileiros (23%) diz conhecer, mas não presta queixas, e outros 16% reclamam, embora não saibam exatamente a que têm direito.
O perfil dos consumidores que mais se destaca em termos de conhecimento, uso do CDC e reclamação é de indivíduos de alto poder aquisitivo (classes A e B), do sexo masculino e mais escolarizados. Também há uma clara prevalência de faixa etária: jovens consultam menos o Código e reclamam pouco. A maior utilização do CDC também está associada à região do país: no nordeste (um dos eixos do “boom” de consumo e ascensão da chamada “classe média emergente”) se utiliza mais, ao passo que no sudeste se utiliza menos.
SAIBA MAIS
- Confira os resultados completos do estudo da FGV sobre o tema: O Brasileiro e o Código de Defesa do Consumidor http://goo.gl/7Gbbk Pesquisa de opinião realizada pelo Instituto Market Analysis, em parceria com o Idec, constata que 95% dos brasileiros conhecem o Código de Defesa do Consumidor, mas poucos já o utilizaram. Além disso, a maioria ainda não reclama quando tem um problema de consumo.
Atire a primeira pedra quem nunca “deixou para lá” uma cobrança a mais na conta do celular, ou desistiu de um produto que quebrou em pouco tempo de uso, por exemplo. Segundo um levantamento realizado pelo Instituto Market Analysis em parceria com o Idec, 52% dos brasileiros não reclamam sempre que enfrentam um problema de consumo ou não ficam satisfeitos com o produto ou serviço adquirido. Porém, isso não significa que os consumidores estejam por fora sobre os seus direitos, pelo contrário: 55% dos entrevistados afirmam conhecê-los pelo menos razoavelmente. Além disso, 19 em cada 20 brasileiros (95%) dizem saber da existência do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Porém, a maior parte (63%) nunca o consultou.
Para Fulvio Giannella, coordenador executivo do Idec, os resultados gerais da pesquisa podem indicar que, apesar do fenômeno recente do acesso ao consumo de bens e serviços, ainda há um atraso referente à consciência social. “Muitos brasileiros ascenderam economicamente, mas isso não se reflete de imediato em progresso social, isto é, em consciência e exercício dos direitos”, destaca. Fabián Echegaray, diretor da Market Analysis, empresa responsável pelo levantamento, concorda. “Os consumidores não duvidam que exista amparo para suas relações com o mercado, mas isso não está sendo suficiente para mobilizá-los em favor dos seus direitos”, aponta.
O gerente técnico do Idec, Carlos Thadeu de Oliveira, chama ainda atenção para o caráter opinativo da pesquisa. “Os resultados apontam para a percepção dos consumidores acerca deles mesmos, mas podem não refletir exatamente a realidade. Ou seja, o indivíduo pode achar que sabe bastante sobre seus direitos, mas, na verdade, conhecer pouco e, consequentemente, não saber como exigi-los”, comenta. No entanto, ele ressalta: reconhecer a existência de direitos é o primeiro passo para exercê-los.
A pesquisa Idec/Market Analysis é fruto da primeira parceria entre os institutos e consistiu em poucas questões de natureza mais geral sobre o conhecimento do CDC e seu uso pelos brasileiros (veja no quadro acima como o levantamento foi executado). Apesar de longe do ideal, os resultados já apontam um avanço em relação a 2011, quando foi realizado um estudo pela Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro (FGV-Direito/Rio), que serviu de referência para esse. Entre eles, está o aumento na proporção de brasileiros que conhecem o Código (de 72% para 95%) e que já o consultaram (de 16% para 37%). Outra melhora foi a queda no percentual de pessoas que afirmaram não conhecer nada sobre os direitos do consumidor, que passou de 18% em 2011 para 8% este ano.
Na avaliação de Ricardo Morishita, professor da FGV e um dos coordenadores do estudo realizado no ano passado, a melhora revela o crescimento gradual da conscientização dos consumidores. “A cidadania é algo que se constrói na sociedade. Essas diferenças [nos resultados das pesquisas] mostram a evolução natural no conhecimento e no exercício dos direitos dos consumidores, que foram sendo introjetados ao longo dos 22 anos de existência do CDC pelas organizações de defesa do consumidor, pela imprensa etc.”
Justamente por isso, o Idec e a Market Analysis pretendem levar adiante mais estudos sobre o consumidor, a fim de aprofundar as questões indicadas nos resultados desta primeira pesquisa. “Esses levantamentos nos darão a oportunidade de traçar melhor o perfil dos consumidores brasileiros quanto ao grau de conhecimento acerca de seus direitos e ao modo como eles os exercem. São informações que certamente ajudarão as entidades de defesa do consumidor a balizar melhor suas ações no sentido de ampliar a consciência da população sobre os direitos presentes nas relações de consumo”, acredita o coordenador executivo do Idec.
O levantamento foi realizado de 26 de julho a 23 de agosto por meio de entrevistas telefônicas com 414 adultos de 18 a 69 anos residentes nas nove principais capitais: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Salvador, Porto Alegre, Curitiba, Goiânia e Brasília. Os entrevistados foram selecionados seguindo cotas cruzadas por sexo, grupo de idade e classe social e com distribuição de casos de acordo com o tamanho dos municípios, a fim de garantir a representatividade da amostra. A margem de erro da pesquisa é de 4,8%, para mais ou para menos.