Por que parto normal?
É natural buscar a ajuda de um profissional qualificado para dar à luz. O que não é natural é ouvir dele a pergunta: "Por que parto normal? Vamos marcar a cesárea".
Desde o fim dos anos 60, as taxas de cesariana vêm aumentando, tanto nos países desenvolvidos quanto nos em desenvolvimento. A Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher (PNDS), de 2006, apontou que o percentual de cesarianas realizadas no país subiu de 36% para 44% nos sistemas público e privado. O aumento desse tipo de parto aconteceu em todo o país, mas principalmente nas regiões Sudeste (52%) e Sul (51%), e particularmente entre as mulheres brancas (49%) e com mais de 35 anos de idade (61%). Entre as mulheres com mais de 12 anos de estudo e as que utilizam o sistema de saúde privado ou suplementar os percentuais alcançaram 83% e 81%, respectivamente. Reportagem da Folha de S. Paulo, publicada em novembro passado, afirmou que em 2010 o número de cesáreas chegou a 52%, superando o de partos normais. O percentual recomendado pela OMS é de 15%.
A cesariana é um procedimento cirúrgico, e como tal depende de sala apropriada, materiais esterilizados, pessoal de enfermagem treinado, médico anestesista e médico(s) obstetra(s) presentes, além de médico pediatra para recepcionar o recém-nascido e realizar os primeiros procedimentos. O impacto do aumento desse tipo de parto no sistema de saúde – público ou privado – é de se imaginar. Além disso, tem as consequências para as mulheres e as famílias que o vivenciam. Estudos mostram que para várias gestantes a cesárea pode se revelar uma experiência difícil e às vezes traumatizante, do ponto de vista emocional e psicológico.
"PARA MUDAR O MUNDO, É PRECISO ANTES MUDAR A FORMA DE NASCER"
Michel Odent, médico obstetra francês
Embora muitas mulheres prefiram o parto normal, fatores não médicos têm sido, há muito tempo, amplamente associados à cesariana, no Brasil e no resto do mundo, particularmente, a comodidade para o médico. Esse termo pode ser traduzido em economia de tempo para se dedicar a outros serviços ou ao lazer, razões financeiras e até desconhecimento de como realizar com destreza um parto normal.
Em março de 2006, o National Institute of Health, departamento de saúde do governo dos Estados Unidos, concluiu que as evidências científicas não são suficientes para comprovar os benefícios da cesariana em relação ao parto normal. Por isso, ela deve ser considerada de maneira cuidadosa e individualizada, de acordo com os princípios éticos. Dessa maneira, as cesarianas não devem ser recomendadas a mulheres que desejam ter mais filhos, nem realizadas antes de 39 semanas de gestação ou sem a verificação da maturidade pulmonar do recém-nascido, para se evitar complicações respiratórias.
Assim, fazemos um apelo àqueles que tomam decisões no país, nas cidades, nos estados e nas agências reguladoras de saúde para que fortaleçam as políticas públicas em prol do parto normal e façam com que sejam cumpridas; aos gestores dos serviços de saúde, para que cumpram seu papel, ampliando suas ações; e aos profissionais de saúde, para que se articulem colaborativamente, buscando competência técnica, ética e política.
E por fim, para responder à pergunta do título, usaremos uma frase do pesquisador e médico obstetra francês Michel Odent: "Para mudar o mundo, é preciso antes mudar a forma de nascer".